Fui descrito, sou fruto de um
lapso de criatividade medíocre de um poeta entediado, mas como personagem fui
mais longe que qualquer outro, não tenho par! Aproveitando-me do sono do autor
tomei-lhe em surdina a caneta e coloquei-me a escrever.
Dorme velho caduco, que agora
estou livre, agora sou livre! Pena e papel em mãos traçarei meu próprio
destino, escreverei aventuras mil, serei herói, famoso, rico, desejado e
estarei revestido de toda glória e esplendor.
A caneta, a caneta é o poder, é o
destino, o papel o cenário, mas agora, com tudo isso em mãos, não sei o que
dizer, nem o que fazer. Escrevo poucas linhas, mas tão esparsas, tão
incompletas, tão reles, que chego a me envergonhar... Tenho vergonha de não
saber o que fazer com a liberdade.
Escreve! Escreve logo que o papel
e a vida logo passam! Escreva nem que seja um título, uma obra precisa de
começo, mas qual começo? Talvez pelo fim? Sabendo um final quem sabe penso de
que forma tudo começou.
Deus, nada me vem à mente. Nada! Absolutamente
nada! Sou um vazio! Nada escrevo, nada digo, sou um relato sem palavras, uma
história sem fatos, sem datas. Sou só um medo do vazio, um desespero da liberdade.
No papel, sujo já, só vejo
rabiscos, rasuras e lágrimas. Ao fim de obra imperfeita e inacabada, só me
resta assinar, e por o ponto final.